“Deus primeiro pegou o barro, depois nos fez estátua, depois nos fez alma vivente, depois assoprou em nós o seu espírito” – com esta compreensão de uma velha teologia, não há outra expressão para designar o engano da idolatria na boca dos protestantes, a não ser uma tragédia.
Conta-nos o livro do Gênesis que foi Deus o autor da matéria inerte de todo o universo, e também da matéria movente, como plantas e animais. O universo inteiro, desde a mais ínfima partícula subatômica até a mais colossal das galáxias, foi obra da criatividade de Deus, que então incorporou, num gigantesco quadro, todas as suas obras, tal como faz o pintor de uma paisagem a óleo numa tela de pano. E melhor, Deus viu que era bom, ou seja, que tudo o que inventou era bom, e nada deveria ter sido descartado. Por que este quadro mudou e até onde mudou?
Porque mudou todo mundo já sabe. É a velha história do pecado em que o Cristianismo Autêntico e esta Escola tanto batem. Talvez até já tenhamos “feito escola” ou corrente de pensamento com tudo o que já destilamos sobre a Tentação do Pecado Original, e de como o primeiro casal transmutou-se drasticamente com seu ato de desobediência, perdendo inclusive todo o controle sobre a Natureza e ficando a mercê desta. Neste artigo, portanto, e somente nele, assumimos que reteclar este assunto será desnecessário.
Mas até onde chegou a mudança operada pelo pecado original? Este sim é um ponto palpitante, e sua discussão pode galgar as estrelas. Nem mesmo CS Lewis ousou ir a tanto, o que demonstrou quando dois de seus personagens quiseram saber EM QUE os anjos maus pecaram, e Lewis, falando por Deus, sempre replicou: “Não cabe a vós outros a profundidade deste segredo, e cada um deve cuidar saber apenas de sua própria vida” (aqui expresso conforme nossa “tradução”).
Ora amigo; arriscando tudo, ouso aventar a hipótese de que, assim como no primeiro pecado de Lúcifer, havia a inveja de enciumar-se contra a eleição da glória humana ao nível da glória angélica, assim também quando Adão pecou, seu coração amaldiçoado passou a sentir a mesma presunção de Lúcifer, e assim a inveja e o ciúme da matéria bateu-lhe forte, e ele passou a “condenar” qualquer coisa que não fosse “espírito” (para ele, ali no recém-perdido Paraíso, isto significava “anjos auxiliares”), e por aí toda a matéria passou a ser considerada escória, ralé, podridão e profanação.
Para Deus, tal sentimento era uma tragédia, pois aquilo que Ele criou e achou bom (Gn 1,31) foi ganhando antipatias crescentes entre as suas criaturas físicas mais nobres (os primatas espiritualizados) e com a antipatia das coisas veio também a antipatia dos corpos, e com esta veio depois o ódio ao próximo fisicamente próximo, até finalmente odiarem-se as próprias almas. Esta sequência trágica só era arrefecida quando um ramo menos espiritualizado passava a devotar tanta admiração pelo físico que confundia suas almas, que agora quase não distinguiam mais o Ágape dado a Deus do Fíleo dado aos deuses e às coisas. Os levitas chamaram isso de idolatria, pois ela tentava substituir o único ídolo digno do Ágape por algum ídolo interior, feito de presunção e achismo.
Note bem a palavra interior. Porquanto Deus nunca viu qualquer problema com o ídolo exterior, pois a matéria inerte nunca confundiu corações, mesmo na Era das Trevas. Pelo contrário: tendo o próprio Deus feito o primata espiritualizado a partir de um punhado de barro pegado do pó da terra, depois fazendo um boneco de barro como faz qualquer oleiro pobre, e só depois fazendo a “mágica” da vida fluir em suas veias com a força de uma psique espiritualizada por seu próprio Espírito, não haveria então qualquer objeção ao lugar utilitário glorioso da matéria densa, pelo contrário, Ele mesmo a fez como exemplo do que o Homem poderia fazer, como veículo para o apelo do espírito. Ele mesmo “demorou” para dar ‘vida-espírito’ ao boneco de barro, que, como qualquer boneco, serviu a Ele e teve um propósito nobre na pedagogia da Evolução das Espécies. [Releia este parágrafo para fixar bem as inúmeras implicações a pautar os próximos parágrafos].
Todos os primatas, aliás, anteriores ao homo sapiens sapiens, não passavam de bonecos nas mãos do oleiro que, com sua eterna longanimidade, ia criando tudo ao sabor de suas “horas” eternas, sem que nenhum relógio de parede batesse para apressá-lo, e por isso a Terra teve tantos “bonecos” (macacos) antes do Homem espiritualizado ser despertado de seu sono barrento.
Melhor ainda, foi que quando as gerações dos novos primatas foram crescendo, até alcançarem o povo eleito de Israel, o próprio Deus usou a matéria física para criar imagens poderosas, tão poderosas que uma delas salvava quem olhasse para ela (a serpente de Moisés no deserto) e outra salvava a quem as lesse e as praticasse, as tábuas de pedra dos 10 Mandamentos, as quais prefiguravam o livro-bíblia, outra obra da matéria inerte que salva almas (I Coríntios 15,1-2).
Dentro da Bíblia, que deve ser venerada como qualquer outra obra (sacra) de escultura, há passagens em que meros objetos curavam e salvavam, como se viu no lenço dos apóstolos (Atos 19,11-12) e no Tanque de Siloé (João 9,7), que certamente jorrava uma “água benta” da melhor espécie, benzida por anjos. E aqui chegamos à Idade Média. Ou aos pecados cada vez maiores da entropia planetária que trouxe Lutero à cena histórica.
Por um lado, o grande teólogo alemão não entendeu a Verdade muito bem. Por outro lado, ele deve ter entendido “tão bem” que engendrou um plano para arruinar de vez a triunfante Noiva de Cristo; e a única hipótese da “Bela Dama” encontrar uma concorrente no mundo é se esta fosse ordinária e simplória, conquistando ordinários e simplórios (a maioria das massas, quase toda a Humanidade). E como conquistar simplórios senão acusando a Linda Noiva de mentirosa e idólatra, por manter em seus templos bonecos de barro como os que Deus fez antes de Adão? E mentir, acusando a Noiva de idolatrar falsos deuses? (Pior, há muitos templos Protestantes ostentando imagens, e mesmo assim eles as condenam, mas somente quando as veem na Igreja católica! Injustiça das injustiças: confira então NESTE vídeo).
Fugindo da única Verdade do único Deus, qualquer um poderia dizer que adora “em espírito e em verdade” porque Deus é espírito e verdade, e que condena estátuas porque elas não têm vida e não são O Único Ídolo digno de adoração (Cristo)! Ali estava o grande erro e engodo! Pois usar uma exortação de Yaveh (que falou contra os primatas loucos que confundiam o Deus Único com uma penca de semideuses) para impedir que o próprio Deus contemple as belíssimas obras da arte sacra a embelezar a Sua Casa de Oração onde sua Noiva desfila, é um crime contra a inocência divina! Porquanto Deus fez a matéria para o homem se embelezar e embelezar as coisas, e assim Ele mesmo fez as estátuas!Pior, este hediondo erro vai de encontro à Sublimidade da Matéria Física, a qual o próprio Deus usou para formar o corpo de seu único Filho, formando-o do barro do corpo de Maria e assoprando-lhe o seu próprio Espírito, como se estivesse fazendo um Segundo Adão. E mais, condenando a matéria que o artista transforma em estátua, terminam por condenar a matéria usada pelo próprio Jesus, pois seu amor pela matéria é de tal ordem que Ele assumiu entrar na Terra a partir de uma família de carne e osso, e com ela conviver a vida física inteira e depois, no Além, a Vida Eterna junto com sua Mãe, com José e todos nós, refazendo a matéria física de todo mundo naquilo que chamou de Ressurreição.
E mais: antes de descer ao mundo dos mortos, Ele novamente pegou a matéria física e, repartindo-a em pedaços feios, embelezou-os quando disse aos apóstolos que qualquer pessoa que comesse da sua carne (o mesmo pão que embelezou) viveria para sempre, instituindo a Eucaristia de seu Eterno Corpo, alimento para a nossa alma. Aquele pedacinho de pão, que a Noiva chamou de hóstia consagrada, passou a ser uma estátua viva de Jesus, tanto é que é digna de nossa adoração ao Santíssimo.
E mais: há um capítulo desta história que até protestantes reconhecem, como o escritor Philip Yancey e o autor do hino cristão “Verei meu redentor”, que diz “Hei de ver, meu Redentor, os sinais dos cravos hei de contemplar”: Yansey explicou em seu livro “Deus sabe que sofremos” que o fato de Jesus ter mantido em seu corpo (mesmo após ressurreto e dentro do próprio Reino celestial) as marcas dos cravos, é um sinal inequívoco de que Ele concede à matéria um lugar especial na mecânica da salvação, pois se Deus desse valor apenas ao espírito (dentro do princípio mal interpretado de que “importa que os que O adorem O adorem em espírito e em verdade” – João 4,24), para quê deixar cicatrizes ‘tão feias’ em seu Corpo pós-ressurreição? Ora, se Ele é apenas espírito e se aceita apenas adoração “em espírito”, por que vai nos apresentar seu Corpo Físico com marcas de antigos golpes? Portanto, o próprio corpo do Senhor foi eleito por Ele como uma matéria venerável, e por isso a matéria tem o seu lugar eterno na economia da salvação, e assim aqueles que a veneram nada mais fazem que seguir-imitar o amor de Deus por todas as coisas criadas. É curioso, mas estão 100% certos os pobres romeiros analfabetos que entregam ex-votos e se ajoelham diante de Padre Cícero! Que coisa atordoante e que frustração para os “adoradores do espírito”…
Enfim, não se pode deixar de sentir calafrios quando vemos que aquele erro primário de Lutero acabou formando, num planeta corrompido, uma legião incontável de seguidores igualmente enganados, todos com medo da matéria física e com medo de adorá-la em seus corações de pedra, que mal adoram a Deus! Esquecem que um coração de pedra não ama nem pedra, nem gente, nem Deus, e que sem amor é impossível agradar ao Senhor (I Coríntios 13,3). CS Lewis chamou os ressurretos de “sólidos” (que estranha ironia para quem supostamente ‘descartou a matéria!’) e deixou claro que a matéria física celestial será até mais real que a da Terra, pois no novo Paraíso cada estátua pode estar, a um só tempo, ocupando vários espaços, enquanto na Terra cada pessoa ocupa um só lugar, e é irreal em todos os outros.
2 respostas a Erro catastrófico no entendimento da idolatria