Comemorando um jubileu todo especial para esta Escola, o prof. JV vem repensar a sua história de vida “ao lado de CS Lewis”, a qual considera como um privilégio e uma graça inefável que recebeu de Deus ainda na adolescência, mudando completamente a sua visão da vida e do universo.
Há exatos 50 anos, em 1965, dois anos após a morte de CS Lewis (22/11/63), maior autor cristão da história moderna, o pastor americano Burton DeWolfe Davis, fundador da 1ª Igreja Batista de Fortaleza e do Colégio Batista Santos Dumont (“A Escola da Vida”), fez a apresentação formal do mestre irlandês para os alunos recém-chegados ao colégio, dando uma palestra com base no livro “A Razão do Cristianismo” (no original em inglês “Mere Christianity”), da Editora Luterana. E naquela saudosa palestra, deu o melhor exemplo de interesse literário a todo o corpo discente e docente da época, trazendo para uma Fortaleza ainda ingênua o bom costume americano/europeu de estudar com seriedade.
Como um verdadeiro pioneiro no Ceará, e tendo o diferencial de ser um pastor-pesquisador de temas do insólito (como demonstrava isso no Salão Nobre do colégio por ele fundado), o Pr. Davis levou todas as turmas a travar contato com um assunto até então pouco debatido e até execrado, como ainda hoje é a Ufologia no meio protestante (os protestantes só veem o diabo dentro dos UFOs). Dentro daquele tema, que ele não tinha medo algum de abordar, ele chegava a explorar até áreas difíceis e aterradores – para crianças e adultos – como o drama das abduções.
Levava fitas K-7 com gravações de abduzidos, mostrava fotos de UFOs, livros insólitos e até a explanação bíblica de eventos ufológicos narrados pelos autores canônicos (coisa impensável na maioria das igrejas até hoje), até “proibidos”, num certo sentido. O grande pastor marcou cada aluno e professor com sua coragem, descontração e pureza de fé, com a qual agradou a Deus na sua paixão literária, onde CS Lewis ocupava o topo na sua lista de livros “divinamente inspirados”.
Contou sobre Lewis, também conhecido por “Jack”, coisas tão profundas e íntimas que muitas vezes chegamos a pensar que Davis era um biógrafo do irlandês, ou talvez fosse alguém que conhecera Jack pessoalmente, em suas idas ao Reino Unido. E sua admiração até então incomum por ele (que o leitor jamais a confunda com idolatria) tinha respaldo em sua própria vida, pois ele dizia que Lewis foi um dos responsáveis pela solidez de sua fé, a qual, sob certos aspectos, suplantou até a firmeza promovida pela Palavra de Deus (quem conhece bem Lewis não negará tal possibilidade).
Enfim, foi ali que o Pr. Davis apresentou CS Lewis a este articulista, jamais deixando de referir-se a outros grandes nomes da literatura evangélica mundial, dentre eles Billy Graham, Dom Richardson, Tim Lahaye, A.W. Tozer, S. Kierkegaard, B. Pascal, David Wilkerson, J. I. Packer, T. S. Eliot, John Bunyan, Rick Warren, C. H. Spurgeon, Dwight L. Moody, John Milton, John Wesley, John Stott e tantos outros que a memória levou, mas pontuando sua admiração pela contribuição de cada um a uma visão bíblica menos “bitolada” em comparação com os credos particulares de outras denominações. Ensinou-me a ver em trechos como “examinai tudo e retende o que é bom” a licença bíblica para a pesquisa irrestrita de todas as fontes do Sagrado, explicando que Paulo, Timóteo, Lucas, João e tantos outros santos eram estudiosos e exegetas, sem qualquer restrição de escolha por parte da igreja primitiva.
Entretanto, nada se comparava às declarações bombásticas que fazia acerca de Lewis, o qual para ele podia perfeitamente ter recebido instruções do próprio Deus e por isso era um tipo de “porta-voz diferenciado”. Chegou mesmo a dizer que quando um crente lê todos aqueles autores (as inúmeras obras evangélicas à venda nas livrarias) recebe deles no máximo “lições didáticas para reforçar a visão dada pelas igrejas a que pertencem os autores”; enquanto que quando alguém lê CS Lewis, “está diante de uma verdadeira escola de aprofundamento teológico ou DENTRO dela, com o próprio Jesus a segurar o giz e a dar aulas no quadro negro”.
Sendo então uma aula do próprio Deus, não haveria como atrelá-la compulsoriamente a um credo eclesial particular, mesmo que algumas denominações reivindiquem tal privilégio tresloucadamente. Ele dizia que nem Lutero, nem Roma, nem a Rainha da Inglaterra nem ninguém recebeu de Deus uma revelação capaz de outorgar o privilégio da exclusividade hermenêutica da Bíblia, e em CS Lewis essa liberdade de consciência ficava patente e soberana.
Este articulista teve, isso sim, o privilégio de ter tido o pastor Davis como mestre e diretor de uma escola como a de Paulo, educado aos pés de Gamaliel, e ainda mais honrado por ter sido por ele apresentado a CS Lewis, sem qualquer ingerência clerical ou influência denominacional, nem mesmo da própria igreja dele, a Batista Tradicional. Hoje só guardo as melhores lembranças da época, as quais vêm reforçar os ensinamentos de Lewis no exemplo de vida do Pr. Davis, que ‘conheceu’ Lewis ainda vivo e talvez “ao vivo”, coisa com a qual eu, infelizmente, não fui agraciado. Porém, como o próprio Jack faria (tirar o corpo fora para que Jesus ficasse em evidência), graça especial mesmo foi ter conhecido Lewis, de quem eu posso dizer, sem rodeios: “o que seria de minha fé sem ele?”…