Somente a humildade infinita de Deus exaltaria uma mulher que teria sido “meramente” sua mãe carnal, tal como Ele assumiu uma família humana, com todos os seus erros e precariedades…
O único Filho de Deus nasceu na Terra dos Homens como resultado da lei natural da reprodução humana, a exceção do fato de que o óvulo gerador de Jesus foi complementado, em sua carga cromossômica, pelo sêmen do Espírito Santo, que “cobriu Maria com sua sombra” (Lucas 1,35) após o SIM decisivo que ela deu a Deus, recebendo o milagre em seu ventre e o curtindo por nove meses, como a gravidez comum de todas as mulheres.
Estando tudo o mais perfeitamente enquadrado na ordem natural das coisas, o segundo seguinte da fecundação do óvulo de Maria transcorreu em perfeita harmonia e saúde, amparada que foi a Virgem “por aquEle que faz retas todas as coisas”. Sem que faltasse ao bebê Jesus nenhum dos nutrientes para seu perfeito parto normal nove meses depois, nascia o menino na humildade plena de sua missão, iniciada dentro de uma manjedoura, ou onde dormiam vacas, ovelhas e cavalos. Desde aquela hora inicial na sua missão terrena, a vida inteira de Jesus se configurou na mais profunda humildade, perfazendo um perfil 100% incondizente com o presumível nascimento do Criador do Universo, que a vaidade humana identificaria como sendo num berço de ouro de um palácio real, rodeado de finos lençóis e colchões, para dizer o mínimo. Engana-se fragorosamente a Humanidade em sua presunção de valores invertidos, e o Criador pouco se importou de aparecer na mais desprezível das cidades, num bolsão de miséria chamado Galileia, pela qual ninguém daria nada de valor no currículo de quem ali nascesse.
E o Menino Jesus foi crescendo em sua casa de humildade, feliz com sua Sagrada Família ao lado de seu pai carpinteiro e sua mãe doméstica, e sem qualquer perspectiva de galgar o mínimo status social naqueles tempos difíceis, sob escravidão do Governo Romano. Todavia e contudo, o Menino nunca sentiu qualquer tristeza por pertencer aquele lar e família, pelo contrário, cresceu uma criança feliz, um adolescente sábio e um jovem portentoso, capaz de encantar até os mestres da época. Aliás, até chegando a sentir plena satisfação da pertença aquele lar humilde, no qual a sua realeza celestial brilhava até os confins do cosmos, e o Menino dormia sob o louvor das orquestras de anjos que lhe cantavam “Glória a Deus nas alturas, e paz na Terra aos homens por Ele amados”.
O Menino, o Adolescente e o Jovem estava tão bem ajustado à sua casa paterna, que devia responder a todos os que perguntavam “onde você mora?” com as seguintes palavras: “Moro naquele casebre sem número, ali da rua sem nome, do bairro dos guabirus, no subúrbio de Nazaré, mas na casa onde mora Maria, esposa e mãe de José”.
Aos poucos, e crescendo em graça e sabedoria perante Deus e o mundo, o Menino foi se sentindo forte, e cada vez mais forte, ao acolher em si toda a fortaleza e virtude de sua mãe, que eram exemplo até para seu pai. Em pouco tempo, Ele se apresentar em sociedade com o currículo enriquecido pelas qualidades celestiais de sua mãe, passou a ser rotina de um “profeta” que precisava entrar bem nos ambientes sociais, e isso ficou provado nos episódios do sumiço no Templo (aos 12 anos), e no episódio das bodas de Caná, aos 30 anos. “Ali estava o Filho de Maria, e não o Jesus de Nazaré”, pensava e repetia o jovem profeta a se reencontrar com João Batista.
Com efeito, tudo demonstrava que a humildade de Jesus enaltecia Maria, tal como Deus hoje e enaltece. Porém devemos atentar para o fato de que quando a Igreja diz que Maria nasceu SEM a mancha do pecado original, comete um terrível engano teológico contra a Cristologia e contra a própria humildade de Deus, porque para Jesus, quanto mais humana e “desvalorizada” fosse Maria, melhor e maior seria a sua honraria (porque mais valor tem a humildade quando sustentada sobre “fatores humildes”). Ou seja, tanto a humildade de Jesus fica mais evidente com a “desqualificação” de Maria, quanto a venerabilidade dela mesma, que merece todos os encômios justamente na medida em que “Deus contemplou a humildade de sua serva”. Isto é, é na pequeneza e na insignificância de Maria que a Teologia pode ressaltar, com todas as letras maiúsculas, a infinita humildade de um Deus Onipotente que a si mesmo se humilhou e se esvaziou por completo, ao ponto de morrer nu numa vergonhosa cruz, no meio de ladrões e malfeitores!
Qualquer outro cenário que mostrasse Maria como os artistas, pintores e escultores a mostraram a posteriori, linda a até com coroa e vestes reais, configuraria o equívoco teológico de diminuir a humildade de Jesus! Simples assim. No entanto, por que a Santíssima Trindade permite que o Reino de Deus seja chamado “Reino de Maria”? A única resposta é a humildade de Deus, que, com sua onipotência, não se sente de modo algum rebaixado por dizer aos 4 ventos que tem uma mãe de carne e osso, igualzinha a qualquer mulher humana, menos no pecado.
Neste caso, fica claro que se os cristãos não se sentirem bem ao ouvir Jesus no Céu convidar todos para seu banquete (dizendo “vinde benditos de meu Pai, ao Reino de Minha Mãe, para a Santa Ceia que ela vos preparou com toda a sua perícia de cozinheira de Nazaré!”), eles não terão nenhum apetite para morar no Céu, ou seja, não gostarão daquela Sagrada Família que ali se reapresenta.
Mas há outros aspectos da Teologia Cristã que podem iluminar melhor a questão. Vejam.
Por que TODO inimigo de Deus odeia Maria? Justamente porque Deus a coroou de honra MAIOR que a dos próprios anjos, e o diabo se corrói de inveja! Já pensou como ele pensa: “Uma mulher? Uma simples mulher? Como pode o Criador coroar e dar todo poder de seu Reino a uma mera mulher? Uma mente simplória como a das mulheres, que mal entendem a si mesmas, e pior, uma mente limitada como a de uma esposa de carpinteiro que nunca frequentou uma escola na vida?! Que Deus idiota faria isso? E que espécie de Reino é esse, onde todo o poder da onipotência fica subjugado pela vontade volúvel de uma mulher carnal? Tss-tss!”…
Logo, está mais que evidente que toda a humildade de Deus repousaria sobre aquilo que aparentemente não tem valor algum para os olhos humanos e muito menos para os olhos dos anjos caídos, e quanto menos valor lhe fosse atribuído, mais humildade seria aceitá-lo como se todo valor tivesse. Neste caso, somente Deus conhece o infinito valor de Maria, e o quanto a sua humildade contribui para enaltecer a humildade de Deus, como em nenhuma outra ocasião na História da Criação desde toda a Eternidade.
Finalmente, somente a humildade infinita de Deus exaltaria uma mulher que teria sido “meramente” sua mãe carnal, sem possuir ela nenhum poder especial, ao ponto de merecer dEle a saudação “Bendita és entre todas as mulheres, ó Maria cheia de Graça”. Por tudo isso é que o Reino de Deus é chamado “Reino de Maria”, pois é a única forma lógica de explicitar a humildade de um Deus que não se sente nem um pouco diminuído pela humildade de sua mãe, pelo contrário, vê-se plenamente reconhecido como Deus, quando sua onipotência praticamente desaparece entre os mil predicados de uma mera israelita da Galileia.
Uma resposta a Por que Jesus permite que o Reino de Deus seja chamado “Reino de Maria”?